Blog

Confira a postagem completa na íntegra

A importância do Dia da Consciência Negra e dos Movimentos Sociais Negros

20/11/2021

Comento nestas linhas o papel da luta negra antirracista na propulsão de uma provável crise da ideologia racial no Brasil e as respectivas reações conservadoras que ela provoca.

Eu, assim como outros tantos brasileiros brancos, devo aos negros a minha condição mais recente de poder reconhecer e combater o racismo dentro de mim e à minha volta.

É principalmente pela luta dos movimentos negros, pelo engajamento de intelectuais, artistas, professores e políticos negros, pelo trabalho de jornalistas negros, pela resistência de trabalhadores e estudantes negros, que estamos aprendendo a identificar melhor não só as situações escancaradas de preconceito racial, mas também a ação cotidiana das estruturas racistas.

E é graças a essa luta que a ideologia racial, tão crucial para a manutenção de nossas práticas burguesas excludentes, está sendo questionada. É por força dessa luta que esta ideologia está em crise. E essa crise provoca reações conservadoras, que visam CONSERVAR o estado de coisas, manter e até expandir privilégios, poder e dominação econômica.

Como já ensinava Florestan Fernandes nos anos 60, este tipo de crise gera “um estado de exacerbação no ânimo das pessoas pertencentes aos círculos sociais dominantes, que favorece o apego emocional a atitudes e a valores sociais obsoletos, ao mesmo tempo que intensifica a resistência à extensão de inovações na esfera das relações raciais”.

Foi o que vimos acontecer no Brasil desde que se intensificaram os programas de ações afirmativas e as políticas públicas inclusivas. A resistência de setores conservadores a uma possível inovação na esfera das relações raciais foi tão profícua no Brasil que até ajudou a eleger um presidente.

Mas há quem negue algo tão evidente. A negação, atitude básica do racista, não é apenas um ato gerador de mais e mais racismo. É um clamor, um manifesto pela manutenção de privilégios, uma forma de não dar margem a qualquer mudança.

Reconhecer que o racismo opera em nossas entranhas seria o primeiro passo. Mas isso não basta. O racismo está de tão modo encalacrado em nossas vidas que a vigilância e a ação combativa teriam de ser cotidianas.

Teríamos de compreender que o racismo está encarnado, delineia nossas subjetividades, assume o controle de nossos músculos, ajuda a sustentar nossos privilégios enquanto brancos e se espalha para muito além das bravatas e mentiras presidenciais, nutrindo políticas excludentes, legitimando a violência policial, justificando nossa inação. O racismo está por toda parte, age o tempo todo, por dentro e por fora, em nós e a nossa volta, fazendo com que ainda sejamos uma das sociedades racialmente mais estratificadas do mundo.

Negar a existência do racismo é a estratégia básica do racista porque a continuidade da desigualdade racial representa para ele uma esperança. É preciso implodir esta esperança.

 

*Nélio Spréa é doutor em Educação pela UFPR e coordenador da Parabolé Educação e Cultura.

Comentar esta Postagem